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Gorjeta para quem?
NÃO DEIXA DE ser uma pitoresca evidência da verdadeira compulsão nacional para o regulamento o fato de a gorjeta para garçons ter se tornado tema de um projeto de lei recentemente aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.
Decerto a elaboração do diploma não é fruto de mera gratuidade ou de capricho parlamentar. Tem justificativas, sendo a mais enfática delas uma outra especialidade da casa: o desvio da finalidade original de um montante. Trata-se da transferência para os donos de estabelecimentos da gratificação oferecida de boa-fé por clientes a funcionários.
Para surpresa de muitos, reportagens publicadas por esta Folha sobre o assunto mostraram que é comum proprietários de bares e restaurantes, em especial os frequentados por gente de poder aquisitivo mais elevado, se apropriarem em parte ou integralmente das gratificações.
No Estado de São Paulo há pelo menos 7.000 ações judiciais sobre a questão. Na tentativa de sanar o abuso, o projeto prevê a obrigatoriedade do repasse da gorjeta aos funcionários, ficando o estabelecimento autorizado a reter 1/5 do valor para eventual pagamento de encargos.
A proposta provocou frenética reação de donos de alguns dos mais caros restaurantes do país. Um deles, passando clamorosamente do ponto, chegou mesmo a prever "quebradeira" no setor.
Melhor seria que nada disso estivesse acontecendo. Que os bares e restaurantes cumprissem as obrigações trabalhistas e cobrassem pelo que oferecem de acordo com as oportunidades do mercado. E que os clientes, seguindo a tradição, pagassem, se assim desejassem, gratificação aos atendentes -cabendo a estes gerir coletiva ou individualmente os recursos. Mas isso seria simples demais para o Brasil.

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