Viaje a seu risco e perigo
Foi preciso que o drama de Patrícia viesse à tona para que a Embaixada brasileira em Madri acordasse?
O CASO DA BRASILEIRA barrada pela imigração espanhola deixou meio mundo indignado. Se você ainda não teve a oportunidade de ficar tiririca com o ocorrido, eis o resumo da ópera: Patrícia Camargo Magalhães, 23, pós-graduanda em física pela Universidade de São Paulo, estava a caminho de um congresso em Portugal, mas acabou sendo barrada no aeroporto de Madri ao tentar embarcar no vôo de conexão.
Autoridades espanholas alegaram "falta de documentos" e, sem maiores explicações, a detiveram com mais de 30 pessoas em condições precárias. A jovem ficou presa por três longos dias antes de ser deportada. Tudo isso ocorreu sem que as autoridades espanholas oferecessem esboço de um pedido de desculpas.
Quando o caso veio à tona, outras moças que sofreram a mesma humilhação de Patrícia resolveram se manifestar. Descobriu-se então que, em relação aos brasileiros e, principalmente, às brasileiras, os espanhóis mantêm uma política de imigração um tanto peculiar: em vez de analisar a documentação apresentada ou de entrevistar os turistas brasileiros que desejam entrar no país, eles simplesmente medem a pessoa de cima a baixo, no "olhometro", e passam sentença da maneira que bem entendem.
Traduzindo em miúdos, o oficial da imigração tira suas conclusões e decide na base do chute: "Esta tem cara de mulher séria, pode entrar" ou "Esta parece puta, não entra".
Qualquer um que já tenha viajado à Europa sabe do que brasileiros são capazes quando estão no exterior. Travestis tapuias se prostituem por dois tostões na Itália e na França. Em Portugal e na Espanha, somos conhecidos como traficantes de drogas e, na Alemanha e na Suíça, as brasucas são tidas como prostitutas de luxo. Estou fazendo uma generalização grosseira? Pode ser, mas quantas vezes o brasileiro que vai para trabalhar, estudar os gastar seu suado dinheirinho de férias não é obrigado a passar vexame por conta desses estigmas?
Pois, para mim, o pior não é nem mesmo saber que estou a mercê de ser julgada sumariamente por alguma autoridade truculenta, inhenha ou xenófoba. O pior é ter a consciência de que, se algo acontecer comigo enquanto estiver viajando com um passaporte brasileiro, eu terei de me virar sozinha.
Como chego à essa conclusão? Ora, ora, alguém vai me dizer que foi preciso o drama de Patrícia sair no jornal para que a Embaixada brasileira em Madri acordasse para a maneira como somos vilificados?
Se, em média, oito brasileiros recebem o mesmo tratamento por dia, por que só depois de o caso vir à tona o ministro Celso Amorim resolveu pedir explicações?
Para que o leitor avalie o grau de inoperância de nossas representações no exterior, tomei o depoimento de um colega que viajou ao Oriente Médio. Veja o que ele tem a dizer: "Precisei de uma declaração consular, tipo um nada-consta, para tirar meu visto de entrada para a Síria. Na representação brasileira em que tentei ser atendido trabalhavam 16 pessoas. Telefonei várias vezes, voltava a explicar e nunca alguém se dispunha a ajudar. Voltei quatro vezes até lá e sequer olharam na minha cara. Detalhe: não havia ninguém para ser atendido pelos funcionários, apenas eu."
BARBARA GANCIA
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